domingo, fevereiro 12, 2012


Pena não ter nascido na época certa. Chove, a tarde é propícia, tenho comigo uma caixa colorida de giz. Pintar o sol que chuva levou embora, naquele outro tempo, quando você ainda era vivo e me fazia feliz. Os cantos da casa molhados de uma luz que me fala do impossível: o não-vivido, o não-experimentado, o que continua a impressionar, a doer. O olhar vai encontrar formigas carregando pedaços de alimento branco-amarelado, açúcar, farelo de pão, talvez. Juntas, companheiras, sobreviventes. Sei que é muito tarde pra desejar ser feliz, mas quando consigo aquela sensação de sonho e conforto das manhãs, penso ter alguma chance de tocar em você, te sentir inteiro, presente. Ontem, quando voltávamos do Nordeste, o Felipe perguntou se sofri muito com a tua perda, se estou resignado, se já te esqueci. Nunca havia reparado antes no Felipe: ele tem uns olhos límpidos, uma voz segura, ombros largos, boca perfeita. Depois dos shows, há sempre um bando de meninas no camarim atrás dele. Enlouquecidas. [...]
In: O sol que a chuva apagou, 2009, p. 04)

Um comentário:

Em Não se vai sozinho ao paraíso, primeiro romance que integra a trilogia místico-erótica de Állex Leilla — cujo centro são as micro-...