domingo, maio 22, 2011


Dizem que baiano não nasce, estreia, ou que baiano burro nasce morto, clichês reveladores de uma cultura local capaz de matar e morrer em defesa de sua especificidade. Evidentemente, alguns povos se consideram especiais e mostram sua autoestima através de manifestações artísticas que lhes são peculiares, enquanto outros, mais contidos, precisam de situações cruciais nas quais vemos emergir traços desse egocentrismo, como num mosaico em que a identidade some e reaparece em zonas ora de luz, ora de sombra.

Nenhum alarme nisso. Trata-se de uma construção de limites entre nós e os outros. Todavia, um traço incômodo da cultura baiana não é a crença de ser, dentre os estados brasileiros, o mais especial, mas a dificuldade infantil de aceitar críticas. Tal traço não se restringe a um grupo social, vai do escritor incapaz de aceitar uma análise negativa ao atendente que não sabe atender. O episódio envolvendo uma das grandes vozes da música brasileira mostra isso. A cantora baiana comentou, no twitter, sobre a qualidade dos serviços em Salvador, um comentário banal (e verdadeiro) que causou rebuliço. Mesmo baianíssima, não lhe concederam o direito de dizer o conhecido: a Bahia tem, sim, um péssimo serviço, mas não é de bom tom apontar. Surgiram argumentos de que os serviços são ruins em todo o Brasil, no Brasil não, no universo inteiro, ou, como diria o Casseta e Planeta, só no universo inteiro não, na Bahia!

Tempos atrás, o artigo dum jornalista baiano trouxe reações iguais: ele escreveu, entre outras coisas, que aqui os homens urinam nas ruas naturalmente, que nossa cultura é limitada, o transporte coletivo é um lixo, quem não tem carro é considerado indigente, o trânsito é um horror, enfim, tudo que já sabemos, mas não queremos ouvir, nem mesmo de quem é baiano também. Novamente foi rebatido: em outros lugares os homens fazem xixi nas ruas, o trânsito é ruim no Rio ou São Paulo etc.

Cá entre nós, qual é a importância de deslocar o foco dos nossos problemas para outros lugares onde eles se repetem? Vamos aprender algo com quem está, feito nós, tateando o ofício de ser cidadão, a obrigação de ser humano, a tarefa de ser civilizado? Qual o sentido de se criar tal comparação? Para nos sentir acompanhados? Para nos convencermos de que não somos tão mal assim?

Parodiando Nelson Rodrigues, envelheçam, meus caros, envelheçam. Baiano ou não, reconheçamos, apesar de ser o estado mais velho do Brasil, nossa Bahia é uma criança mimada, incapaz de aceitar críticas. Quem sabe, talvez, quando amadurecermos?

8 comentários:

  1. Anônimo1:02 PM

    Entendo que a questão levantada não é a bainidade, mas a qualidade de vida cultural e social. E quem tem um papel importante nesse caso são os órgãos públicos (nesse caso: Prefeitura de Salvador e govrno do Estado da Bahia) tentando mostrar qualidade e eficiência nos serviços públicos e fazendo campanhas educativas, o que esbarra na essência bom: investimento em educação. Então, deveriam aproveitar a preparação para a Copa de 2014 para melhorar o transporte público, o trânsito, qualidade de atendimento do turista e dos próprios moradores. A oportunidade está aí...

    Xokito Cunha

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  2. Seguramente, nenhum serviço público municipal ou estadual funcionam na cidade da Bahia.
    Transporta, educação, saúde, etc... E ainda contamos com a enorme população deseducada sujando e contribuindo com a falta de bom senso para com o restante. Quem há de dizer que não?

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  3. Anônimo12:13 PM

    Marceleza, você se refere a Salvador ou a todas as cidades da Bahia?
    Xokito Cunha

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  4. lucas jasper5:56 PM

    Entre tantas e tantas coisas. Muito bom!
    E tem gente que infelizmente confundi a baianidade com o preconceituoso termo "baianisse".

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  5. Anônimo9:37 PM

    A Bahia realmente é muito atrasada no quesito civilidade. E aqui me refiro à Bahia e quero dizer Salvador e recôncavo. Onde mais as pessoas são tão mal educadas a ponto de não terem o mínimo respeito pelo vizinho ao abrir o fundo do carro e despejarem em plena madrugada o "melhor" do pagode baiano nos ouvidos daqueles que estão querendo dormir depois de um dia de trabalho? Onde mais a gente tem que andar pelas calçadas tendo que tomar cuidado pra não pisar nas bostas dos seus cachorrinhos tão amados que saem com os donos para obrar em plenas calçadas? Onde mais não se vê pessoas trabalhando, seja em repartições públicas ou não, com aquela carinha de que está ali fazendo um favor para toda a humanidade?
    É certo que em outros lugares se vê coisas desse tipo, mas como na Bahia não existe.
    A Bahia é medalha de ouro em incivilidade, em grosseria e falta de educação!!
    E também na infantil incapacidade de receber críticas. Toda e qualquer crítica contra a Bahia e os baianos é tratada como a mais profunda heresia.
    É povim chifrim!!!
    Cirilo de Marilac

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  6. Anônimo9:38 PM

    Comentário corrigido!!

    A Bahia realmente é muito atrasada no quesito civilidade. E aqui me refiro à Bahia e quero dizer Salvador e recôncavo. Onde mais as pessoas são tão mal educadas a ponto de não terem o mínimo respeito pelo vizinho ao abrir o fundo do carro e despejarem em plena madrugada o "melhor" do pagode baiano nos ouvidos daqueles que estão querendo dormir depois de um dia de trabalho? Onde mais a gente tem que andar pelas calçadas tendo que tomar cuidado pra não pisar nas bostas dos seus cachorrinhos tão amados que saem com os donos para obrar em plenas calçadas? Onde mais se vê pessoas trabalhando, seja em repartições públicas ou não, com aquela carinha de que está ali fazendo um favor para toda a humanidade?
    É certo que em outros lugares se vê coisas desse tipo, mas como na Bahia não existe.
    A Bahia é medalha de ouro em incivilidade, em grosseria e falta de educação!!
    E também na infantil incapacidade de receber críticas. Toda e qualquer crítica contra a Bahia e os baianos é tratada como a mais profunda heresia.
    É povim chifrim!!!
    Cirilo de Marilac

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  7. É estranho pensar que nossos erros, até aqueles que nos definem, não são só nossos? O trânsito, a falta de educação, de maturidade para aceitar críticas, tudo é universal. Será que a grama é igual dos dois lados da cerca? Será que isso é um problema?

    Saudades Állex!!

    Mardônio.

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  8. É sempre mais fácil aceitar o defeito do outro. Quando vamos entender que o outro é o nosso reflexo no espelho.
    Seria bom se todos, independente de localização geografica pudessem se tornar seres educados, responsaveis, conscientes e bons...mas fazer o q é certo é sempre mais difícil, e enquanto isso vamos errando...é mais fácil e podemos nos escondeer sob desclpas variadas...sob discursos que levam a visões preconceituosas.

    ótimo texto.

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