domingo, agosto 22, 2010


A velhice, dizem, assim como o amor que amadureceu, perdeu o frio na barriga e a tensão da incompletude, nos leva a uma espécie de resignação que pra alguns é paz, pra outros é decrepitude. Todavia, envelhecer continua sendo um processo complexo, que ultrapassa a questão da idade e pode ser reiventado pelos próprios atores que o protagonizam. No melhor filme dessa estação, "Hanami - cerejeiras em flor", a decrepitude está nos mais jovens, filhos do casal de idosos Trudi e Rudi. Enquanto seus pais conseguem, cada um a seu tempo, se reencantarem com a vida e consigo mesmos, seus filhos são representados como frios, distantes, sem tempo, impacientes, cruéis, mortalmente chatos. Esse rencantar com o mundo, com o outro, com as miudezas da vida, está nos mais velhos, especificamente no casal protagonista, e constitui a beleza do filme. O ponto de partida da história está na notícia que Trudi recebe: o marido, Rudi, tem poucos dias de vida, talvez mais alguns meses, dizem os médicos, que aproveitam para lhe aconselhar a viajar com o marido, quem sabe realizar uma aventura, um sonho. A voz de Trudi, em off, nos comunica, no entanto, o impasse: o marido detesta aventuras, detesta novidades, é daqueles seres que preferem a rotina, os velhos hábitos, o conhecido. Quem realmente gosta de aventuras, deseja ir ao Japão, é ela; ela que está saudável, ela que se coloca como mediadora entre o marido e o mundo, ela que cultiva o gosto pela arte, pelo drama. Dentro desse pequeno impasse, contornado pelo amor que nutrem um pelo outro, o filme se desenvolve. Cheio de sutilezas, rico de pequenas simbologias, lento, por vezes cruel, por vezes sublime, o filme vai construindo as relações entre homem-mulher, pais-filhos, irmãos-irmãs, nora-sogros, Ocidente-Oriente. Ótimo filme. Veja você também.

Ficha Técnica:
Título Original: Kirschbluten - Hanami.
Origem: Alemanha / França, 2008.
Direção: Doris Dorrie.
Roteiro: Doris Dorrie.
Produção: Harald Kugler e Molly Von Furstenberg.
Fotografia: Hanno Lentz.
Edição: Frank C. Muller e Inez Regnier.
Música: Claus Bantzer.

3 comentários:

  1. Ainda bem que vc não contou do elemento surpresa, pois a perspectiva do filme muda drasticamente. Ótimo post.

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  2. Assistirei, Állex.
    Aproveito para observar que você comeu o "e" de "reencantar": Esse rencantar com o mundo...
    Abraço.

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  3. Certamente, uma das melhores películas que vi este ano (apesar de ter chegado um pouco tarde por aqui).

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