domingo, setembro 27, 2009




Sabe-se que ela tem saudades dele. Do centro do céu sem nuvens, sem primavera, desloca-se a cabeça, olho direito, olho esquerdo, o tronco todo, pra ver o céu da janela da cozinha. Move-se cheia de soluços na garganta. Molha as mãos e o rosto. Faz café. Sabe-se, sabemos: ela sente a falta dele como ninguém. Bicho desencontrado tentando sobrevoar a terra de muros e concreto que não nos pertence. Desde que ele foi embora da Bahia, ela sente sua falta. A ópera de Nabucodonosor, ela ouve. Ela que odeia ópera. Músicas antigas, músicas novas, ela ouve, pensando nele. Logo ela que um dia o irritou seriamente dizendo: prefiro o Morrissey. De repente, ela ri e pensa: se alguém (ele) me pega agora...
Ela quer dizer: se ele a pegasse ouvindo suas músicas preferidas. Ela gravou algumas num Cd de 80 minutos e ouve sozinha, andando pela casa, deitada, consertando o cabelo, mudando de lugar os objetos.
As mulheres que melhor escrevem neste mundo, ela agora as pega pra ler. Mas não prossegue muito, vai de livro em livro, de página em página, e chora, chora no meio das palavras de Florbela Espanca, de Clarice Lispector, de Hilda Hilst, de Violette Leduc, de Margueritte Duras, de Ana Cristina Cesar, de Juana Inés de la Cruz, de Alfonsina Storni. Embaçando as palavras, ela chora com saudades dele.
Não adianta estender a mão.
Não estenda sua mão.
Ademais, quem te pediu ajuda?
Tenha decência, ela não te notará.
Só uma pequena grotesca obsessão. No caminho dela, o que há de mais triste e desajustado. Qualquer alegria que a presença dele pudesse dar.
Esteja certo(a) de sua solidão absoluta.
Não amole.
Fique quieto(a) apenas. Passará.

2 comentários:

  1. oi, leilla! li que dias 22 e 23 tem uma oficina com você. (joguei seu nm no google, parei aqui). e é justo sobre os meus dois filmes preferidos. e envolve a exposição de sophie calle, que eu tb tanto amei. será que se eu disser ao meu chefe que vou cuidar do coração ele me libera? vou tentar. :) até lá.

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  2. Állex...já sentí isso...mas nem houví opera...rs rs rs..estendí a mão e até ouvia o celular "tocar"...iche solidão gosto não...do texto gosto lindo!

    bjs

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