segunda-feira, dezembro 24, 2007


[...]
O silêncio congela o mundo, faz com que seja possível para mim o trânsito dentro dele.
Em silêncio observo sua oscilação em partir: quase ia ontem, e hoje, graças a Deus ou ao Demônio, acorda um tanto melhor.
A absurda cor do mar se cristalizando embaixo do sol.
Acordo tarde, durmo tarde, sensação de que sequer dormi.

Há anos engulo minha disposição tamanha de sair pelo mundo gritando seu nome, santo e doce é o teu nome que de súbito descubro: quase não o pronuncio mais. Por medo, talvez.
Estou comendo capim e vendo bolas de assopro pelo ar. É a infância? O desamor? Não digo nada: leio Carlos Drummond de Andrade.
O excesso de tudo, cara, o excesso...
E você resiste, você resiste.
De repente suspira e faz que ri mas fecha os olhos antes murmurando: odeio perder cabelos...
Posso contar quantas vezes por dia te ouço resmungar: odeio isso, odeio aquilo.
Você resiste.
Soberano, ora longe ora perto, num instante quase acoplado à minha pele, respondendo monossilábico sobre todas aquelas histórias que nunca consegui esclarecer. [...]

****

Pra tornar tudo leve. As bolas de assopro fazem festa no céu.
Espero a morte e não tô nem aí.
Dedo cortado ao tentar abrir uma garrafa de vinho.
A vida inteira pra vê-lo de perto.
A terra - flor de fogo./ O homem decide o seu destino... / Que não dirão de nós a fera e a estrela?
Pouco sei.
Que minha cabeça dói quando amanhece tão nó nas vértebras assim.
Que às vezes é melhor estar de olhos fechados pras imagens.
Os séculos de poeira atiçando a vontade do corpo de ser somente pó.
Tua voz enchendo de ar a sala.
Solto as bolas de assopro coloridas. De duas em duas pela janela.
É minha festa solitária.
Você vai me ver anos e anos antecipado. Lá de Buenos Aires, parar de cantar um minuto e pensar em mim. Me fotografar. Como se naquele tempo já fôssemos amantes. E você pudesse, no meio do palco, sentir uma falta aguda de mim.
Te olhando cá do Brasil.
Sozinho na sala. Sentindo saudades de ti.
Vendo-nos, todos os mortos, que dirão?
Eu pouco me importo. Que me deixem em paz os poetas.
Quero apenas nele pensar.
[...]

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